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domingo, 20 de fevereiro de 2011

Dia atípico - By Sahge


Semana passada, tive um dia que  foi dentre os meus dias ruins (uma vasta e tediosa coleção) o pior de todos. Não sei a frente no futuro. O pessimismo que tomou meu espírito nas ultimas semanas é tal que bem posso imaginar umas mil e tantas situações tenebrosas em que eu poderia desbancar aquele do posto de “pior dia da minha vida”.  Espanto esses pensamentos a golpes de música alta e muita sublimação. O passado já me dá angustias  demais e o presente perspectiva de menos para que eu me sinta em condições de tratar também do futuro. E, sobretudo pensar o futuro com uma sombra de pessimismo sobre os ombros.

O dia começou com um acidente de carro. 

Numa via de transito rápido uma motorista saiu da rotatória e entrou na frente do carro em que eu ia sem olhar ou dar a preferência.  O carro atingiu-a na lateral e o veículo dela foi arrastado uns cinco metros. Ambos os carros ficaram destruídos, mas, felizmente ninguém ficou ferido, o que em tempos mais amenos eu chamaria de milagre. Todos inteiros, a exceção de uma luxação na minha panturrilha que ainda está ardendo como o inferno.  Ainda não acredito, dada a força da colisão, que eu estou aqui vivo digitando isso. Esquisito...O acidente aconteceu num segundo, mas ainda posso ver a cena em câmara lenta. Vidro voando, o carro da motorista patinhando na pista, o barulho de metal se retorcendo, o cheiro forte de gasolina, a pressão do cinto de segurança quase me partindo os ossos e as buzinas de outros veículos sinalizando.O mais estranho é que na hora, não fiquei com medo de morrer. Vi a dama de negro passar bem pertinho e acenar-me, mas não tive reação alguma, nem receio nem expectativa. Correspondi ao aceno sem rancor ou simpatia. É possível estar tão letárgico que nem mesmo a pavorosa chance de virar picadinho de gente num acidente terrível possa causar uma comoção qualquer?


Só fiquei ali, sentado no meio fio pensando, olhando para os carros arruinados, que a vida é algo que se perde fácil...Só fiquei realmente assustado quando a senhora que estava no outro carro contou que havia acabado de deixar as crianças na escola. Teria sido horrível se ela ainda estivesse com os pequenos no carro e eles se ferissem ou morressem.  Acho que no fim das contas, pensando que poderia ter acontecido uma tragédia fora o prejuízo com o estrago e o aborrecimento com a seguradora, até que saiu barato (e nesse caso, embora toda vida seja preciosa, a vida daqueles que mal a começaram tem um valor maior quando posta ao lado daqueles que já tiveram tempo de realizar alguma coisa. Se alguém tem de se salvar, então que sejam as “mulheres e crianças primeiro”).

O dia que se seguiu foi tão tenso que ficou na minha cabeça a imagem de Michael Douglas em “Um Dia de Fúria”  e fui tão e constantemente espezirritado (espezinhado e irritado) nesse dia pela vida, pelo universo, pelas pessoas e pelas circunstâncias, que confirmei para mim mesmo que as chances de que eu venha a me tornar um homicida um dia são mínimas. Dei provas de uma paciência (ou apatia) dignas de Jó. Suportei situações que fariam Ghandi ter uma síncope e o dia findou de um modo senão poético, no mínimo lírico, sem que com isso eu queira dizer que tenha sido agradável.  Embora o placar tenha sido de 1000 a zero para a vida, creio que eu mereço uma medalha por ter sobrevivido ao ontem. Passou, mas quer me parecer que o passado e eu sejamos irreconciliáveis. Ao menos por enquanto.

Fui para a cama com um exemplar surrado de “O Livro dos Sonhos” e pensando na obra de Gaiman, Sandman ( a minha favorita) pergunto; Se o Destino, a Morte, o Sonho, Destruição, Desespero, Desejo e Delírio são perpétuos, seriam efêmeros  o Acaso, a Vida, a Realidade, o Inicio, a Esperança, a Apatia e a Razão ?

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