Beleza?
Que é que eu sei de beleza meu deus!?
(Que é que eu sei de qualquer coisa?)
Me
disseram uma ou mais vezes há muito tempo que eu não era bonito. Para meu
infortúnio, eu era criança e crianças tem o dom de acreditar em tudo. Receio
que acreditei neles de modo irremediável talvez. Mas penso que segundo a estética
de algum lugar do mundo, talvez entre os aborígenes da Austrália ou entre os
povos de alguma ilha perdida ao sudeste dos trópicos e meridianos do mundo, alguém
de passagem por mim talvez considerasse que eu fosse uma visão agradável ao
olhar.
É
uma possibilidade, mas estou inclinado a duvidar dela. Que é que eu sei de
estética?
Eu
deveria achar “belos” um pôr do sol, um bebezinho sorrindo, uma imagem em
flashplayer de uma flor desabrochando, uma pintura abstrata que não compreendo
bem ou o rosto anguloso daquela moça que passou por mim com olhos lacrimosos uma noite ou duas atrás...
Belos?
Sem duvida! Belos ao engano dos meus olhos que não passam da superfície das coisas.
Mas
quantos pores do sol, bebezinhos sorrindo, imagens em flash ou moças de rostos simétricos
terei de ver até que algo disso me fale ao coração de tal modo que eu possa
genuinamente dizer que tais têm significado para fora da estética?
Que
pôr do sol, bebê sorridente (excluindo minha filha, porque aí já tenho uma
opinião demasiado comprometida), imagem ou moça bonita passou por mim e alterou
o curso do meu destino ou minha percepção de que existe algo para além da
superficialidade das coisas vistas?
O problema é a fugacidade com que essa beleza toda desfila diante do engano dos meus olhos, porque sempre virá um por do sol mais rubro ou dourado, um bebê mais risonho ou uma moça mais bonita...
E a estética continua para mim a ser um abismo insondável.
Dái
me dizem que “a beleza está nas coisas simples”.
Que
lindo! Que pensamento mais gracioso e delicado...
Mas
como quase tudo que é simplesmente gracioso e delicado e que agrada aos
sentidos imediatamente ( e dos quais desconfio imediatamente), esse pensamento carece de alguma sustentação.
Mas
não sou eu que vou tentar baseado na minha ignorância do que é beleza ou
estética, a dizer se as coisas simples é que são belas.
Só
deixo um “talvez”.
Talvez
a beleza não esteja nas coisas simples, que são facilmente percebidas
sem esforço, mas na capacidade de ver o belo das coisas complexas, que não são simplesmente
bonitas.