O real problema de se envelhecer, é que é este é processo
demasiadamente lento. Ocorre com um
vagar que possibilita degustar todas as minúcias dessa decadência sutil. Um
cabelo branco a mais, um fôlego a menos, a soma de um cansaço a mais, uma energia
subtraída e do montante, entre perdas e
ganhos, resulta uma impaciência que vai
se instalando quando se percebe que já é bem tênue o fio que te liga a quase
tudo o que antes te fazia atravessar meio mundo para buscar.
A morte assustadoramente mais perto a cada dia, ameaçando te
privar do pouco de alegria e de significado que ainda resta no mundo.
A morte, a mesma morte, desgraçadamente longe demais para te libertar
da angustia que é suportar a angustia de ter que morrer e de ter que viver a
morte a cada dia.
Foi o que? Cinco ou seis anos atrás? Você estava atrasado e
corria dois quarteirões morro a cima para pegar o ônibus. Agora, quando tenta
fazer o mesmo, pára na metade do caminho
sentindo seus pulmões e garganta em fogo e seus joelhos feito água. Mas
não o suficiente. Você está velho, meu caro, mas não o suficiente.
Daí quando você viaja para algum lugar, se apaixona pela
estrada, pelo percurso...E sonha nunca
chegar ao destino e jamais retornar ao ponto de partida. Você sente inveja de
tudo o que se vai, de tudo o que vira a esquina e tem a liberdade de se ir, daquele saco plástico que o
vento da tarde arrastou para o céu e para longe...
Você sonha em cair pra cima
e flutuar para sempre sobre os grandes vazios da terra, sobre os desertos, geleiras,
campos e mares infinitos...Cruzando
ocasionalmente com aquelas outras almas flutuantes...
Mas, oh, diabos! O metrô está lotado como sempre, mas não o
suficiente para te esmagar de vez e te libertar do peso do esmagamento. O calor está infernal na cidade, mas não
chove nem água para aplacar o calor e nem fogo para purgar essa Gomorra
belorizontina de seus pecados mundanos. Os pecados de BH não são o suficiente para
merecer um dilúvio de fogo. Aquele cidadão está irritadíssimo porque você
explicou pela décima vez que sim, vai ter de pagar tal e tal taxa municipal,
mas a raiva dele é insuficiente para que tenha um dia de fúria e saque uma arma
e liberte a si mesmo e a você da angustia de ter que discutir por uma quantia,
que ele provavelmente gastaria em alguma banalidade...
O problema de se envelhecer, é que isso ocorre de um modo
modorrento demais para que você se importe em estar envelhecendo.
Você nem
mesmo fica velho o suficiente para lamentar a perda da juventude.
E nem
celebrar a chegada da maturidade. Porque você sabe, com uma percepção que só
tem quem deseja cair para cima, que nunca foi jovem o suficiente para viver
irresponsavelmente uma infância e puberdade. Havia sempre uma sensação gelada
de que havia mais na vida do que a efemeridade dos folguedos e você olhava pra
cima enquanto o mundo corria a sua volta. E você envelhecia lentamente, percebendo que o fazia.
Também jamais será velho e sereno o
suficiente, ainda que viva um século, para aplacar a inquietação. Haverá sempre
a arder o calor de saber que o céu, por mais infinito que seja, é insuficiente
para conter o seu desejo...De flutuar
para sempre.