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sexta-feira, 10 de junho de 2011

Mea Culpa entre amigos



"Eu nunca perdoei homem algum, porque nunca me magoei com homem algum."

A frase acima é atribuída a Mohandas Gandhi e eu não busquei e nem vou buscar uma referencia  na internet para confirmar se ele realmente disse isso ou mesmo se ela está corretamente em harmonia com o que ele quis dizer. Sinto-me, porém, injusto em fazer referencia a ele, sem sequer saber se ele pensava realmente assim, porque se existe algo que aprendi a abominar, é  que me citem ou digam que eu disse ou tenha feito algo que não e verdade,  e embora isso seja irrelevante para Gandhi (esteja ele onde estiver ou não esteja), não me permito cortesias que não lego aos outros.Mas isso e outro assunto. Tendo sido cunhada por ele ou não, a frase merece algumas considerações.


O caso, é que essa frase só pode ter sido mesmo cunhada por um santo, porque não consigo imaginar um só ser humano que não tenha em algum momento se magoado com alguém por qualquer motivo. Talvez eu não conheça muitos seres humanos afinal. Santos, conheço menos ainda! Na verdade, apenas os dos livros litúrgicos ou os feitos de gesso nos altares e esses últimos, estou certo, são realmente incapazes de sentirem-se magoados ou furiosos com alguém. Eu sei de mim que santo nunca fui e nem tentei ser.  Mas comungo com Gandhi, ou seja, lá quem tenha cunhado a frase acima, da incapacidade de sentir raiva (ao menos por um tempo prolongado) das pessoas. Mas diferente dele, minha incapacidade para a raiva ou magoa prolongada, não vem de um espírito elevado ou de um modo de vida pautado pela nobreza de sentimentos, mas da preguiça, da extrema preguiça de ficar submetido a sentimentos que ferem e que me ferem e aos quais me acho por qualquer motivo impedido de dar pronta solução. Aqueles, não se magoam por nobreza e virtude, este que vos digita, o mesmo faz por egoísmo e preguiça. Sou mesmo um ser humano lastimável... E o pior é que gosto de ser assim!


Até sinto raiva (muita) de situações, de fatos que já não me são possíveis alterar ou de ficar preso numa condição de impotência diante de algo. Isso e diferente. Odeio, realmente odeio não poder mudar o passado, odeio me sentir indefeso ou vulnerável contra algo com o qual não possa lutar, mas sei bem que essa também não e uma raiva razoável. E isso e que é o inferno em ser um sujeito razoável! Nem mesmo posso me dar ao luxo de ter uma atitude emocional destemperada! Chutar o pau da barraca e mandar tudo ao inferno, por assim dizer... E essa incapacidade faz de mim um ser humano deplorável, menos humano, porque segundo já andaram me acusando algumas vezes (todas as acusações absolutamente pertinentes e justas, para a alegria do meu ego inflado), penso mais do que sinto ou fico psicologicamente fascinado demais pelos meus sentimentos para dar vazão a eles.


É estranho pensar em ficar com raiva das pessoas, especialmente se estas não estão mais em contato comigo para que possamos chegar a um consenso, um meio termo ou mesmo uma paz branca, sei lá...  Fico pensando naquele conto de Dickens e meus devaneios me mostram uma cena na qual lá estou eu, tal qual o velho Scrooge, sozinho no fim da vida, arrastando atrás de mim uma corrente de ressentimentos cujos elos se estendem ao infinito; e em cada elo destes vejo o rosto de alguém que uma vez passou por minha vida e me deixou sozinho no vento.


 Mas não mesmo! Se eu não posso falar diretamente com a pessoa, tampouco vou transformá-la num ressentimento. As pessoas a quem amo merecem mais do que isso.

Agora, se me permitem, preciso falar direta e indiretamente a um amigo muito querido que talvez nem queira me ouvir...


Este era para ser um post pautado pelo principio da impessoalidade (conversa fiada, claro! Nenhuma das minhas linhas tortas é impessoal), mas acabou sendo um meio de falar a este amigo, já que ele não quer mais ser um amigo e por isso fechou todos os nossos canais de comunicação, que eu não estou com raiva dele 

'Juro que não estou (e peço que leve isso em consideração a meu favor, amigo, já que eu não gosto de falar de assuntos diretamente pessoais por aqui porque certamente vou ter de dar explicações a uma meia dúzia de pessoas genuinamente preocupadas comigo e isso é por demais maçante para eles e para mim). Quero dizer que você não precisa da minha indulgência, mas que  compreendo seus motivos e sentimentos e os respeito ( e esteja certo meu caro, que isso não é fácil de fazer) e que sei bem que é complicado lidar comigo. Alegre-se com o fato (que dependendo do grau da sua mágoa para comigo, pode ate servir de uma vingança indireta. rsrsrsr) de que você só teve de lidar comigo por pouquíssimo tempo, mas eu por meu lado tive de lidar por mais de três décadas e possivelmente terei de lidar por outras três ou menos ou mais. Sei que não foi fácil para você também. Eu nunca sou fácil e estou ciente disso. Queria que as coisas tivessem sido diferentes, mas a droga do Universo teima em nunca respeitar o meu querer e não posso mudar as tolices que eu cometi ou que outros cometeram em meu nome e se esqueceram de vir depois dividir comigo o ônus. Lastimo muito o rumo que as coisas tomaram e esteja certo de que eu teria realmente me empenhado para sermos amigos de novo. Mas você se recusou e eu não sei se já comentei que tenho, dentre as muitas limitações minhas, uma certa dificuldade em arrombar portas fechadas, não importando o quanto eu deseje vê-las abertas. Por favor, não confunda o meu respeito pelas suas decisões como falta de interesse ou raiva. Sinto raiva da situação, daquilo eu não posso mudar, mas enfim, não é, e nunca será raiva de você. Sinto raiva, é da minha falta de serenidade em aceitar as coisas tais como elas são. E sinto raiva de estar com raiva disso.'


'Mas mesmo numa relação entre amigos, quando ocorrem problemas, há sempre a tendência de ambos se atribuírem o papel de vitima, mas sabe, eu me sinto particularmente desconfortável neste papel. Prefiro que sinta raiva de mim a sentir de você.'


'Do meu lado, nada tenho a perdoar porque não há ofensa alguma a ser perdoada, mas só posso falar por mim e se é seu destino ou escolha caminhar em outra direção e apartar-se de mim, não leve de mim lembranças tristes ou amarguras, porque penso que eu  talvez também mereça um pouquinho mais do que isso. Mas se necessita ouvir isso de mim, mesmo eu nada tendo a perdoar, sim eu o perdôo, desde que em retribuição e resposta, perdoe-me você também por eu ser quem e o que sou e os atritos que tivemos resultantes desse meu ser. Os termos dos meus sentimentos e da minha oferta permanecem e permanecerão para sempre os mesmo. Quer ser meu amigo?'


'Caso queira, sabe onde estou (alguns lugares, deixarei de freqüentar para o meu bem, mas ainda estou onde sempre estive e você sabe o caminho) e se se resolver por me estender a mão, esteja pronto para que eu a agarre com a força de todo o meu afeto. Se não, siga o seu caminho sem culpas em relação a mim porque ei de te guardar na memória como uma lembrança alegre. Toda a sorte do mundo para você neste seu caminho. Que não haja nele sempre flores, porque não acho positivo que os olhos se acostumem unicamente com o belo, mas que você tenha força para suportar e vencer seus espinhos. Confio nessa força. '


'É a minha natureza teimosa, eu acho, e não há nada no momento que eu possa fazer em relação a ela...'
Atenciosamente,
Seu amigo para sempre, (pelo meu lado ao menos), Sahge


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