Então me sentei ao pé daquela árvore. Chutei para longe a plaquinha recém
colocada com os dizeres “não pise na grama” e pensei irritado para que diabos
serviria uma grama senão para ser pisada, senão para ter a sua suavidade
sentida pelos pés cansados...Confesso:sou a porcaria de um utilitarista, e a praça tem trocentos metros de grama e não iria
ser daquele pouco mais de metro e meio que eu iria abrir mão.
E fiquei durante um tempo gozando a sensação bem familiar de não ter, a
não ser o pé daquela árvore dentre todos os lugares do planeta, lugar algum neste planeta que eu pudesse chamar de lar.
Sensação reconhecível como
minha, coisa mais familiar do que a alma que me habita, rebelando-se, protestando
para abandonar-me, porque assim como não reconheço neste mundo como lar nada
que esteja além das fronteiras do pé dessa árvore, minha alma não reconhece como casa o corpo que habita e eu permaneço em
fragmentos e em discordância até com as minhas contradições.
E o inferno sorri...
...e então quando sinto a grama e olho por momentos para essa praça, tudo
tão frágil e tão brilhante; cachorrinhos, flores, crianças, pássaros e o som fervilhante
da cidade em torno dela, a cena se move em minha mente e por uns momentos
chego a duvidar de que algo de fato morra no mundo...
Daí a mesma grama me lembra, minha mente salta a cena e eu vejo a teatralidade, a
maré de gente perdida de si, fantasmas pálidos se aquecendo em
banalidades enquanto a iluminação de natal desmorona, a cena congela em meu
coração e chego a duvidar de que algo no mundo de fato viva...