Quando havia mais na vida do que essa sutil dor de existir que cobre tudo como uma manta cinza?
Bem, seu corpo cresceu, adoeceu... Adolesceu, amadureceu e o mundo te engoliu, te vendeu anseios e, (pasme!!), conseguiu te convencer que eram seus aqueles desejos de status e riqueza . Você vendeu barato o azul do seu sorriso para receber em troca o amarelo dos sorrisos de aprovação dos outros, uma tentativa tola de fazer parte, quando o que você realmente queria era ser aceito. E agora as únicas portas que você procura abrir, são as que te levam ao emprego mal remunerado, à vida mal vivida, às relações sufocantes e simbióticas (quando não parasitárias) e ao jugo inacreditavelmente pesado da vida comunal.
Deixou de ser Um, para se tornar mais um, ao preço de sua alma.
Uma nulidade indistinta em meio a seis bilhões de pontos cegos.
A sua alma, o que restou do pequeno vagabundo, do livre Huck Finn em você, se rebela e anseia (oh como anseia!) mandar o mundo ao diabo e descer o rio da vida em mais uma jangada...
E enquanto você pensa que não são os cabelos brancos que te dão um ar de decadência, mas sim os cabelos pretos restantes, você suspira, olha para a janela, vê as nuvens deslizarem macias no infinito azul que antes iluminava o seu sorriso e sente ódio de si mesmo por ter crescido.
Não seria assim, você raciocina, se todos os seres humanos nascessem com um relógio embutido na carne. Se pudessem fazer voltar o ponteiro do tempo ou mesmo emperrá-los. Deter a marcha inexorável, não da morte da vida (porque essa só assusta os fracos e covardes), mas da morte em vida (essa sim, apavora quem anseia um horizonte mais amplo), da entropia que primeiro rouba o azul do seu sorriso, depois arranca o significado das coisas que você aprende a desamar por fúteis e por fim, o nada se apossa da sua alma.
Ninguém vive dentro do tempo.
E a iminência de um beijo é sempre mais excitante do que o beijo.
E a iminência de um soco é sempre mais dolorosa do que o soco.
A iminência de um ser humano, a jovem promessa que suspira e lateja em sonhos cada vez que vê nas núvens, mais do que vapor de água esbranquiçando o céu, a larva sonhadora, é sempre mais iluminada do que o ser humano que brota e viceja na sua condição de nada, além de carne, sangue, falhas e uma magnífica singularidade.
Isso é ser humano. E “ou você é...Ou o buraco te ensinará a ser”.
Ser a iminência do absoluto ser humano, ciente do eterno e insaciável nada.