Se ao menos não me fascinasse tanto os
fragmentos de vida sobre os quais bocejo meu desinteresse sutil,
Se ao menos eu não estivesse tão
empenhando em olhar para o vazio da noite esperando ver – o que? Gritos de
socorro nas esquinas lá fora que sufoquem os gritos de socorro emudecidos aqui
dentro? – sondando, tentando achar o que quer que se ache quando se olha pro
vazio da noite
Se ao menos não me importunassem com
conversas enfadonhas os fantasmas da minha insônia,
Talvez me aprouvesse ser menos
introspectivo para fora e mais extrovertido para dentro.... Eu faria carnavais
silenciosos enquanto seguraria o queixo e olharia pela janela, perdido em
atitude meditativa.
Um dia desses a rotação da terra me jogou
para fora da cama dela (não me lembro qual, porque estranhamente ainda me
aconchego em seus edredons e sorrisos no escuro) e tive que orbitar apenas em
volta daquelas perguntas que deixei de fazer e das respostas que ela não me deu.
Mas ela.... Se empenhou apaixonadamente
em ser uma mulher, mas negligenciou um tanto de sua humanidade, brincando com
meu espanto quando lhe dizia que as duas coisas dançavam juntas e não eram
antagônicas.
Por meu lado, fiquei enredado, perdido,
devotado com ardor em minha humanidade e no processo, me esqueci completamente
de ser um homem...
E eis-nos aqui, no limiar de qualquer
coisa entre o que somos, o que queríamos e devíamos ser.
Mas na matemática das coisas, a paixão
dela deu fruto e flor e ela se tornou uma mulher notável, extraordinariamente
humana em sua feminilidade.
Eu por outro lado, tanto me esforcei e
como resultado, sou um ser humano sofrível e o masculino se configura para mim
em mistério e não sou completamente nem uma coisa e nem outra.
Apenas levemente irritado e um tanto
comovido quando ela vem me pedir auxílio com as tampas de pote de maionese e
com os grandes dilemas da existência, quando sei bem que ela se vira com essas
coisas melhor do que eu.
Um truque indulgente para eu não me
sentir tão inútil quando os badulaques da mesa da sala de estar.
Ainda me perco, caindo infinitamente pra
dentro em pensamentos, enquanto setembro agoniza, a chuva pendura no céu - e
ameaça e promete - e ela passa óleo nas pernas e ri da minha confusão.
E eu ouço o riso que espanta as
pensamentos do céu, a chuva que agoniza dentro de mim e a confusão dos meses em
que me perco e penso que amar é bom...
Miseravelmente bom.
...
Mas se você amar qualquer coisa que não
lhe traga uma considerável quota de dor (ainda a iminência da perda), talvez
seja só uma inferência de alguém que não sabe o que é amor, mas talvez eu saiba
e creio que talvez é você que esteja chamando de amor algo que seja
alheio a isso..
Caro Luiz, ler suas palavras sempre me passa a sutil sensação de que talvez eu não possua a profundidade na sensibilidade sentir o suficiente para absorvê-las por completo.
ResponderExcluirA sua instrospecção tão autêntica é, que sinto-me puxada para dentro da sua mente ao ler o que você escreve. E reluto, um pouco, pois é bastante íntimo o seu sentir e isso me dá, não sei, a sensação de ser invasora. Mas se expõe, e se o faz também belamente, solto apenas e me delicio com palavras e com a maneira que seu uso delas me faz sentir.
Que bonito mesclado entre algo de puro e algo de mundano eu vi nas imagens que seu texto coloriu. Mas no meio de todo esse caos - que não entendo bem, mas teimo em reler - minha vontade é de abraçar suas palavras. Porque elas são sinceras e a sinceridade nesse mundo me emociona. E por isso eu as leria quantas vezes fossem e seja lá o que contasse.
Obrigada por escrever.
Um abraço.