Eu me lembro de uma definição singular que uma amiga usa para definir a inquietação: Para cada solução eu arrumo um problema. Difícil pensar em qualquer outra coisa que descreva com maior primor esse estado constante de agitação, como se eu fosse uma fábrica de três turnos a produzir o caos, e sem mercado consumidor para escoar a produção. Talvez eu acabasse criando algo que fosse útil a alguém, caso me dispusesse a fazer com meu tempo, mais do que conjecturar o absurdo, dessacralizar o divino, perscrutar aquilo que é irrelevante...
Era mais fácil quando me imaginava um tipo qualquer de artista, porque eu pensava que quando o homem é privado, por algum motivo, daquilo que o distancia da natureza, a saber, o trabalho, retorna a este mesmo estado de natureza, desprovido de sua humanidade. Mas enquanto o trabalho, tal qual o concebemos nos alça da condição de humanos para máquinas por seu utilitarismo (uma preocupante inversão da evolução que deixa de ser natural e passa a ser cultural), a arte nos liberta... E eu gostava de me imaginar livre.
Ela é a mais refinada forma de trabalho e a única que é plena em seu significado, pois sua finalidade e seu simbolismo estão contidos não num resultado ou num lucro, mas naquilo a que se propõe: a própria arte.
Num livro sobre Psicologia Existencial (A Negação da Morte, por sinal, excelente livro!), li que "artista, é um neurótico capaz de criar". Que seja. Na falta de uma definição que não seja dada pela própria arte, esta me parece tão boa quanto qualquer outra, e como o normal é ser "razoavelmente neurótico", eu diria que artista é um ser humano capaz de criar. Quer me parecer que esse dom oscila de vez em quando em momentos em que curiosamente a inspiração é muita, mas a capacidade para traduzir essa força em versos, música, pintura ou outra forma de arte se acha ausente. E eu tento me resignar a isso e contornar esse anseio por criar no nada, porque gente muito melhor do que eu sucumbiu por excesso de humanidade. E é exatamente isso que é a inquietação, que nos fez descer das árvores ou abandonar o Éden: O arbítrio da nossa humanidade.
Esta noite, na aula de Psicologia Humanista (contra a qual não me é possível deixar de fazer muitas ressalvas), falávamos sobre potencial e talentos inatos. Parece-me que podemos acabar chegando a conclusão de que muitas pessoas podem até desenvolver um grande talento em muitas áreas, mas algumas demonstram um dom maior para outras atividades. Enquanto rabiscava um poema ( que como outros tantos provavelmente ficará inacabado) , fiquei tentando descobrir o meu, já que parece que minha arte, que talvez não fosse algo de extraordinário, mas que me deixava amplamente satisfeito, resolveu desaparecer como se eu tivesse me tornado cego para tudo que não fosse o absurdo do mundo.
...
Talvez amanhã eu possa fazer melhor (um anseio que talvez me tire o sono, talvez me adormeça), mas hoje, foi tudo o que consegui espremer do meu espírito. Tenho de ser menos exigente.
...Sentir o invisível além dos sentidos e se angustiar além do razoável...Mas que droga de super-poder!
.
Nenhum comentário:
Postar um comentário