Bem ao fundo, onde você se funda
Nas bases íntimas do seu eu,
Naquela noite eterna e cintilada de estrelas por detrás das suas pálpebras
Lá, na escuridão púrpura, pontilhada por luzes distantes,
Nas raízes primárias de onde voce ergueu;
Esse sorriso fácil, mentiroso e gentil,
E esse sarcasmo
E esse senso de humor duvidoso…
E essa formalidade elegante com a qual despacha, preenche certidões e mandados…
E essa afetação educada nos cumprimentos a toda a gente…
E esse olhar astuto a negociar preços e taxas menores de juros…
E esse ar preocupado e solene ao ler as notícias dos desvairos do mundo…
E esse suspiro sonhador e perdido ao se deliciar por manter para si um segredo doce…
E esse aborrecimento tardio ao descobrir aqui e ali sinais de selinidade…
E essa vaidade tola pela adulação ao suposto da sua erudição…
E a eterna postergação para tomar decisões perfeitamente adiáveis…
Abaixo, dentro e por detrás de tudo isso;
Que há nos recônditos interiores de si, meu pobre Luiz, criatura confusa e erma de si mesma?
Há um herege blasfemando sacrilégios para o nada ?
Um crente fiel e fervoroso a oferecer culto e súplicas às estrelas?
Um monge? Um louco?
No seu interior há um menino perdido e desamparado a clamar pelo pai?
Há um romântico abandonado chorando eternamente a perda da alma amada?
Há uma fera raivosa e sedenta a uivar sua fúria para a lua?
Ou uma ave canora e cantante a entoar louvores ao sol?
No fundo e no fim, é tão somente um poeta do desamparo,
Teimosamente forjando no fogo brilhante do que é belo a luz do dia
Odes e trovas sobre sussurros noturnos,
Sobre temas falados nas sombras por onde se esgueiram duendes e sonhos ruins.
E enquanto a vida corre, o dia arde, o verde toma conta da paisagem,
Você espera pelo cair da noite para se sentir pleno…
Colhendo bouquets de espinhos em jardins floridos…
Alguem lhe nomeou embaixador e porta voz da dor?
Ou lhe designou arauto a falar pelo silêncio?
Ou é simplesmente uma inclinação natural e, portanto, bela, à escuridão?
Mas olha; enquanto voce passa a salada para a pessoa ao lado
E comenta desinteressado sobre o tempo com a pessoa da frente
e se distrai com uma brisa no rosto, súbita e ignorada por todos os convivas
O relógio do tempo ainda corre na mesma direção
E o dia se sucede a noite bem como a noite ao dia.
A marcha da vida não se interrompe,
Enquanto voce oculta a alma atrás do crachá, do número do RG
E se pergunta se o sapato combina com o cinto…
Nenhum comentário:
Postar um comentário