Eu...
Não sei quanto tempo
se passou ou quanto tempo estive a olhar por aquela porta as
distâncias infinitas desses horizontes atras de horizontes até que
por fim tive consciência de estar consciente e de estar olhando
por ela.
Creio que eu pensei ser
eu próprio a abertura e o horizonte lilás emoldurado por ela. Se é
que eu estava pensando qualquer coisa.
Quando se está por tempo demais a
fazer uma coisa, torna-se a coisa por excelência e eu fui uma porta
aberta para as grandes distâncias até que comecei a perceber que
percebia.
Mas o fato é que
estive a olhar por uma porta, porta esta que está na parede dessa
cabana na qual está a mesa, na qual está o livro no qual nesse
momento escrevo.
Escrevo a você, embora
eu saiba que provavelmente nunca vá ler isso.
Tampouco é carta que
eu possa assinar, pois o inusitado dessa situação é que eu não
sei quem é você a quem escrevo e tampouco sei quem sou eu, este que
te escreve.
Todas as histórias
talvez comecem com uma frase redundante, então há de me perdoar se
começo do começo, relatando o momento em que deixei de olhar a
porta aberta e as montanhas depois dela e me pus a examinar o
ambiente a minha volta, surpreso em que houvesse eu a volta do qual
havia ambiente a observar.
Como eu disse, estou em
uma cabana simples, um cômodo grande com pouca mobília:
Uma cama sobre a qual
há colcha e travesseiro, uma mesa tendo por cima uma moringa de
barro com água, um tipo de pão de frutas e um queijo qualquer
gorduroso e odorífero.
Ha também uma cadeira
dura de encosto baixo e janelas de ambos os lados da cabana.
Ela própria é feita
de madeira e adobes e embora seja limpa e confortável, tem ar
bolorento, como se fosse casa antiga e por muito tempo inabitada.
Não faço ideia de
como cheguei aqui e de quem eu sou ou fui.
Mas certamente sou ou
fui alguém e certamente cheguei aqui de algum modo e ao pegar esse
livro para escrever a carta que nunca enviarei, comecei a me sentir
um pouco mais seguro, pois é certo que a medida que o lápis corre
por esse papel branco vou desenhando a mim mesmo junto com essa
história...
Nenhum comentário:
Postar um comentário