Eu havia prometido não falar mais de deus ou dos deuses.
Eu
já prometi não prometer nada.
Tem muito que eu já disse que não mais faria e
faço e farei (e aqui estou eu, na minha trocentésima postagem quando me vem a
memória a promessa de não escrever mais nada).
E tem tanta coisa que eu já me propus a não fazer (ou mesmo
sentir) mas eis que me encontro sempre e sempre de volta a velhos hábitos, como
um maldito viciado, que sim, me assumo uma pessoa volúvel (desgraçadamente
ciente de que o é, para azar meu) e lá vai:
Sobre os deuses...
Religiosos enchem o saco.
Ateus idem e com a mesma virulência.
E eu sou um apóstata de todas as minhas crenças e
descrenças e por vezes, defendo com tanta veemência os meus não-pontos de
vista, que me irmano a camarilha irritante de gente que teima em impor a sua
visão de mundo aos outros.
Mas como já falei deles e me causam preguiça mortal,
quero mais é que se danem. Ou que me permitam danar-me em paz...
Mas hoje tenho de abjurar da crença em um último deus em
que eu depositava alguma fé.
E desconstruir outro que eu sequer sabia que recebia culto
e reverência.
O primeiro é o deus Diálogo.
Confesso que o altar deste recebia
de mim as mais fervorosas orações e súplicas. Eu pensava ( e alguma parte quase perdida de
mim ainda pensa) que qualquer coisa entre as pessoas poderia e seria resolvida,
compreendida, apaziguada, conciliada, sancionada em comum acordo ou de outra
forma, que o Diálogo era a ponte que uniria e a marreta a quebrar os muros entre
os seres humanos...
Mas a nossa era é uma era de medo do Diálogo, das conversações em poucos caracteres, porque as
pessoas não mais falam, por medo de se expor e não ouvem, por receio de não
compreender aquele que por ventura se arrisca a mostrar que não é um
super-homem e que chora e que ama e que sangra...
O medo e a resultante incapacidade de reflexão e consequente
compreensão do outro, matou o deus Diálogo.
Ainda que haja retórica em
contrário, toda a conversa que se tem é campo de batalha para fazer valer a
força, não da lógica ou da razão, mas a força da força, trincheiras onde as
pessoas que querem parecer fortes se escondem com medo que o outro veja a sua
fragilidade.
Homens de vidro voluntariamente mudos e surdos em armaduras de aço.
O segundo deus a quem tenho de mandar ao limbo sou eu
mesmo.
É sério!
Fui até ontem uma divindade.
Não aos meus próprios olhos, está claro.
Mas aos olhos equivocados de pessoas que cismaram sei lá
por que diabos, que eu era um tipo qualquer de Lama iluminado ou um guru
espiritualizado.
Teve gente que teve receio de me falar coisas muito simples,
como se eu fosse uma coisa qualquer de pura ou muito santa que não deveria ser conspurcada
por linguagem baixa ou assunto chulo.
Mais de uma garota me brindou com o maldito “amor Ágape” (e
teve a feliz ideia de me contar essa porcaria, à guisa de fazer-me sentir “especial”),
castrando-me, desprovendo-me de pênis, testosterona e defeitos, me colocando numa droga de altar quando eu
queria que me quisessem na cama ou no inferno, que são os lugares em
que uma mulher deveria colocar o homem que lhe serve ou não lhe serve.
Mais de um homem tomou-me a bênção ou veio a mim em busca
de conselho sobre coisas que eu ignorava (e ainda ignoro) ou buscando perdão
por pecados cometidos, não contra mim, mas contra si mesmo, como se eu, pelo
suposto da minha “idoneidade moral”, estivesse em posição de dar-lhes a
absolvição que eles próprios não se davam.
As pessoas que eu conheço ficam particularmente chocadas
quando me posiciono a favor do aborto, do casamento entre pessoas do mesmo sexo,
da Auto-eutanásia, da liberdade irrestrita de pensamento ou contra a pena de
morte (ééé... Porque "gente santa", em geral, curiosamente é a favor da pena de morte).
Acham absurdo que eu coma carne e não recicle o lixo e
pensam que eu fico a vida inteira com a cara enfiada num livro, meditando, em contemplação
de sei –lá que universo metafísico, procurando a solução para os grandes males
da humanidade enquanto as pessoas reais vivem vidas reais.
Pro inferno com o amor Ágape! Pro inferno com toda a deferência
com que me tratam!
Sou um homem, não um clichê de “ser superior”.
Eu sou desse mundo mes amis, ainda que não o compreenda.
Justo eu, o pior ser humano que eu conheço (até porque eu
sou o único que realmente conheço, já que está todo mundo entrincheirado e com
medo de se mostrar, mas eu não posso esconder de mim o que sou)!
Daí abjurar do deus diálogo e do suposto da minha
divindade.
Daí estar inclinado a viver, pensar e escrever com um tanto
mais de agressividade, fazendo uso dos atributos que são considerados “humanos”,
não para convencer meus confrades de que sou gente, mas para o reafirmar para mim
mesmo, por que seria o fim da picada se eu me deixasse convencer pela opinião
corrente de que não sou...